Uma casinha com quintal. Quando Sandra Marques resolveu abrir uma unidade do seu badalado restaurante Capim Santo em São Paulo, sua única exigência era que o lugar preservasse a mágica do espaço original de Trancoso. Para isso, era preciso trazer um cheiro da Bahia para a cidade mais populosa da América. O ponto de partida foi que o novo endereço tivesse um jardim, um quintal, onde os clientes pudessem sair da selva de pedras e mergulhar em um ambiente verde. “Fomos pioneiros em ter um estabelecimento com uma área aberta na capital”, relembra Sandra, referindo-se ao imóvel instalado na Vila Madalena, onde o Capim funcionou por 6 anos.

Foi quando Sandra e Nando Leite, os fundadores do Capim Santo, resolveram retornar para o comando da casa de Trancoso – que também funciona como pousada – que aram o bastão para a filha, Morena Leite, há pouco formada na Le Cordon Bleu, na França. A chef então se juntou a jornalista Adriana Drigo e reabriram o restaurante em um casarão rodeado por plantas no bairro dos Jardins. Assim, o Capim Santo fincava definitivamente sua bandeira em território paulistano.

De lá para cá, muita água rolou. Comandado por duas mulheres fortes, o negócio deslanchou. Vieram os prêmios e novas portas se abriram. Foram criados o Instituto Capim Santo e o bufê, que atende os maiores eventos do Brasil – de Cirque de Soleil ao The Town. Também ou a operar dentro de grandes instituições, assinando as cozinhas do Hospital Sírio-Libanês e das escolas São Luís e Beacon School, todos em São Paulo.

Em 2020, o Capim Santo ganha um museu para chamar de seu. Ele a o ocupar os jardins do Museu da Casa Brasileira, atual Solar Fabio Prado, no Jardim Paulistano.

Verde que te quero verde

O Capim Santo está instalado em um jardim com várias espécies de árvores catalogadas e é palco perfeito para quem quer ter uma experiência ao ar livre. Com a cenografia assinada por Miguel Pinto Guimarães, iluminação de Maneco Quinderé e paisagismo de Carla Oldemburg, peças de design brasileiro complementam a decoração do ambiente. O mobiliário é feito com madeiras certificadas e de fabricantes que levantam a bandeira da sustentabilidade.

Assuntos como preservação ambiental e responsabilidade social são levados a sério pelo grupo. Tanto que ele acaba de conquistar a certificação como Empresa B, concedido a companhias que tenham em seu DNA bom relacionamento com os colaboradores, igualdade salarial, plano de carreira, prática sustentável, entre outros itens avaliados. “É o primeiro, e único, bufê a ter esse selo no Brasil”, orgulha-se a CEO do Capim, Marcia Reis. Vale destacar que o país possui apenas 304 empresas com essa certificação – são 1.077 na América Latina e 7.081 no mundo – unidas em um movimento global por um sistema econômico, inclusivo, equitativo e regenerativo.

Na Vila Madalena: primeiro restaurante de São Paulo a ter área externa / Divulgação
Na Vila Madalena: primeiro restaurante de São Paulo a ter área externa / Divulgação

Eu vim da Bahia: a origem

Lata d’água na cabeça e fogão a lenha no quintal. “Quando cheguei, em 1981, Trancoso não tinha nada. Não dava para viver da arquitetura naquele momento. Então, o jeito era realmente plantar para comer”, lembra Sandra Marques, que sempre gostou de cozinhar, mas nunca tinha pensado em viver disso. A brincadeira começou a ficar séria quando ela e Nando Leite, então seu marido, resolveram arrendar o bar São João, localizado no Quadrado e considerado o primeiro boteco do lugarejo. O local se tornou o hit do verão. E Sandra teve que dar um jeito de alimentar a clientela, que não tinha outra opção a não ser o seu balcão.

Gostou tanto da experiência que, pouco tempo depois, alugou uma casinha simples onde montou uma lanchonete com a venda de pães, bolos, salgados ou qualquer outra coisa que conseguisse produzir. “A gente era naturalista, macrobiótico. Então usávamos o que tínhamos no quintal e ao nosso redor”, diz Sandra. PANCs (plantas alimentícias não convencionais) sempre foram parar nas receitas mesmo antes de serem classificadas assim, com esse nome pomposo-científico. “Lembro que servia umas cumbucas com ingredientes frescos muito parecidas com poke (receita havaiana). Isso há 40 anos! Era arrojado”, completa.

Em 1985, quando o Capim Santo nasceu, Sandra já era conhecida na região pela sua boa gastronomia. O tal boca a boca fez com que o seu nome chegasse às redações e muitos jornalistas começaram a fazer matérias sobre o restaurante, que ficava em um verdadeiro paraíso quase desconhecido no sul da Bahia. O Capim foi parar na revista Playboy, na coluna da badalada Joyce Pascowitch e ganhou o mundo. Foi nessa época, inclusive, que Sandra criou alguns pratos icônicos da casa como o peixe no iogurte.

Comida tropical brasileira

Morena, que cresceu ali enrolada nas pernas de Sandra dentro da cozinha, logo percebeu o poder da comida como uma forma de comunicação com o mundo. Falante e curiosa, a menina sempre foi uma apaixonada por gente. O amor pela gastronomia veio depois. Aos 15 anos, decidiu ir ver de mais perto o que acontecia em outros cantos do planeta. Primeiro, foi estudar em Cambridge, na Inglaterra. De lá, resolveu seguir os os da mãe e se matriculou na Le Cordon Bleu, em Paris. Assim nasceu a chef Morena Leite, uma entusiasta dos ingredientes brasileiros trabalhados com técnicas sas.

Sandra e Morena uniram com perfeição intuição e método. Desenvolveram juntas o DNA do Capim Santo. “Costumo dizer que faço comida tropical brasileira”, define Morena, que não dispensa em seu cozinhar a velha e boa salsinha. “É uma das minhas marcas. Limpa o sangue e ainda colore a comida”, completa. A quentura da pimenta e o cítrico dos limões também estão sempre presentes. E frutas: banana, coco, abacaxi...

Aquela menina que sempre gostou de estar cercada de pessoas continua do mesmo jeitinho. Morena é curiosa e divide com quem a rodeia o que vem coletando pelo mundo. Divide por meio de suas receitas o que o mundo lhe ensina, dia a dia. “Sou uma turista incansável. Adoro compartilhar com as pessoas aquilo que aprendi, que estou vivendo. Sou uma nômade e estou sempre por aí.”

Chef nômade: Morena Leite, que comanda o restaurante Capim Santo, fundado por seus pais há quase 4 décadas na Bahia / Divulgação
Chef nômade: Morena Leite, que comanda o restaurante Capim Santo, fundado por seus pais há quase 4 décadas na Bahia / Divulgação

O cardápio de uma chef nômade

O menu do Capim Santo é marcado pelo uso de ingredientes brasileiros. Viajante incansável, Morena Leite também traz referências de sabores de outras partes do mundo como o Oriente Médio e o Sudeste Asiático. “Tenho minhas fases, tive um momento tapioca, banana, castanha”, diz a chef. Os clássicos da casa - como o ravioli de tapioca recheado com queijo Canastra e molho de ervas; e o nhoque de mandioquinha com recheio de brie e mel ao molho de sálvia – vão se alternando com pratos criados de acordo com a sazonalidade e a estação do ano.

No momento, a casa acaba de apresentar seu cardápio de primavera, que traz entre outros pratos, o refrescante vinagrete de polvo e a lagosta grelhada com salada tropical servida no abacaxi. Impossível não sentir o gostinho da Bahia ao degustar os churros de tapioca com vatapá e frutos do mar. Dá para sentir até o perfume de Trancoso a cada mordida.

Receitas clássicas do Capim Santo por Morena Leite

BRIGADEIRO CAPIM SANTO

Tempo de preparo: 10 minutos | grau de dificuldade: fácil | rendimento: 10 porções

INGREDIENTES

 - 50 g de folha de capim santo

 - 100 ml de leite

 - 395 ml de leite condensado (uma lata)

MODO DE PREPARO

Bata as folhas de capim santo com o leite no liquidificador e coe. Repita o processo, até que o leite fique verde escuro. Em uma a, misture o leite com o leite condensado, mantenha em fogo baixo e mexa até engrossar. Distribua entre 10 potinhos e leve à geladeira.

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